Me faz lembrar um trecho do livro Santa Evita, de Tomás Eloy Martínez, um misto de biografia, reportagem e ficção que me parece uma das melhores obras para entender o imaginário político e mítico que os argentinos construíram sobre Eva Peron. Lá pelas tantas, ao revelar as informações mentirosas que constaram dos documentos de seu casamento oficial - origem, idade, nome -, Martínez saca uma interpretação que considero magistral: Peron e Evita mentiram porque se acreditavam donos da História e sentiram-se, portanto, livres para fraudar a verdade elementar dos fatos. e
Pois eu acho que é assim que Eduardo Cunha, e agora, a julgar pelas notícias da imprensa, também a sua 2a mulher se sentem: acima da realidade, uma espécie de húbris que traduz o descomedimento e a autoconfiança excessiva, a presunção absoluta de que os fatos podem ser controlados e moldados de acordo com a sua (deles) vontade (retiro da Wikipédia as referências ao conceito de húbris). Só isso é que me parece explicar esse estado de alheamento, um olhar opaco de Cunha a cada vez que ele faz pouco caso das acusações que lhe são imputadas, como se estivesse em transe psíquico.
Que gente é essa? Vou parar de escrever sobre esse escândalo porque me parece que a análise política da atual conjuntura não consegue dar conta da sua essência multidisciplinar e quase antropológica, mas torço para que um desses escritores de fôlego jornalístico nos dê uma interpretação sobre o fenômeno que estamos testemunhando, talvez o ponto mais obscuro da nossa história recente.
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